Notícia

O “P” de canais na gestão dos 4 “Ps” de Marketing

30/01/13

Há algum tempo, quando nos referíamos ao quarto “P” do mix de Marketing tentávamos traduzir para “praça” o que em inglês é placement, ou seja, algo como “colocação” de produtos e serviços ou sua “disponibilização” ao consumidor.

Essa grande diferença de significado gerou confusões, tanto quando as pessoas erravam quando tentavam concertar o equívoco ao traduzir placement por “canais de distribuição”. Atualmente se diz “canais de Marketing”, simplesmente porque é mais abrangente do que “canais de distribuição” (conceito logístico) ou “canais de vendas” (um conceito parcialmente correto).

O termo “canais de Marketing” é mais apropriado porque pressupõe que junto com oproduto também chega ao consumidor ou shopper todo um conjunto de iniciativas de comunicação de mão dupla. A própria embalagem é uma ferramenta de Marketing para o shopper e o SAC, uma ferramenta de Marketing e fidelização para o consumidor.

Tome-se o exemplo da indústria de bebidas, na qual a pulverização do produto em mais de um milhão de pontos de venda no Brasil a torna a categoria com maior penetração no varejo entre os bens de consumo. E é essa penetração no varejo que permite o acesso fácil aos domicílios, que, por sua vez, expande o consumo e, consequentemente, o market share de quem trabalha melhor seus canais. Mas, quem cuida da estratégia de canais da sua empresa?

Em geral, a área de vendas é a responsável por definir os canais por meio dos quais os produtos chegarão ao shopper e ao consumidor. É do departamento de Vendas aresponsabilidade de “abrir novos clientes” e descobrir distribuidores em regiões ainda não atendidas. Mas, do ponto de vista estratégico, o que isso significa para o negócio? Ou melhor, o que significa ter Vendas como guardião dos canais da empresa?

Significa que quanto mais pressionados por resultados de curto prazo, mais os vendedores e gerentes regionais irão “flexibilizar” a estratégia de canais para atingir suas metas. Essa autonomia para decidir de forma descentralizada, e muitas vezes descoordenada, sobre os canais de Marketing da empresa acaba criando situações de conflito entre intermediários ou guerra de preços entre varejistas.

Analisemos o caso da Louis Vuitton. Ela não vende seus produtos nos famosos “outlets” de descontos americanos, como a maior parte de seus concorrentes diretos. Isso é uma estratégia de canais altamente eficiente para proteger o “brand equity” (o valor da marca).

A estratégia de canais é fundamental para garantir o sucesso dos produtos no mercado (não que algum nível de conflito entre membros do canal – atacadistas e distribuidores, por exemplo – não seja útil. É sim). Às vezes, os distribuidores são tão ineficazes em atender a demanda potencial da região em que atuam, que é recomendável estimular um certo nível de conflito saudável para aumentar a saturação de mercado. Principalmente no caso de produtos de baixo desembolso e baixa complexidade, como isqueiros e canetas. O oposto também ocorre, infelizmente. Algumas empresas veem o distribuidor como um mero “atravessador”, uma visão antiga e ultrapassada do papel do intermediário. Esses fabricantes forçam seus distribuidores em guerras de preços que acabam tirando muitos agentes sérios do mercado e estimulando empresas fiscalmente mais “flexíveis” em seus territórios. Um desserviço ao consumidor e ao Estado.

A estratégia de canais é uma disciplina geralmente tratada com muita atenção pela alta direção. Na maioria das empresas de bens de consumo, a área é liderada do ponto de vista intelectual por Trade Marketing, que cuida do seu aspecto B2B, ou seja, a relação estratégica entre fabricante/ marca e seus distribuidores, representantes de vendas ou vendedores e varejistas.

Se você não é da área, neste momento deve estar se perguntando como é que a estratégia de canais é feita na sua empresa? Em algumas delas, o planejamento de canais fica sob responsabilidade da “administração de vendas”. Essa opção denota uma abordagem mais operacional, no sentido de “fazer funcionar” o canal, do que propriamente de planejar sua estratégia. Em outras (as mais evoluídas), além de Trade Marketing, que cuida da atuação da marca junto ao shopper no ponto de venda, há a figura do “gerente de Desenvolvimento de Canais”. Um nome bacana para o gestor que planeja a atuação das áreas de Vendas e Trade junto aos intermediários. Em empresas de bebidas, cigarros, salgadinhos e outros produtos que necessitam ampla distribuição, esse é um profissional imprescindível.

O gerente de Desenvolvimento de Canais atua com a área Comercial, estabelecendo o “como”, “onde” e “quanto” cada canal da empresa irá representar na difícil tarefa de disponibilizar os produtos de forma economicamente viável para os intermediários e para os shoppers da marca. Ele ou ela deve pensar em aspectos da operação logística e tributária. Porém, é no aspecto da competitividade comercial e do modelo de negócio dos agentes intermediários e facilitadores do processo que esse gestor mais gasta seu tempo.

Pense nas franquias, por exemplo. Elas respondem bem ao dilema de todo o gerente de Desenvolvimento de Canais: como obter controle sobre a execução que o canal dá para minha marca sem ter que ser dono do canal? No passado, a Zara era dona de todas as suas lojas – exercia controle total da execução – e encontrou dificuldades de expandir na velocidade em que a demanda crescia. Isso exigia muito capital imobilizado em lojas.

Já a Subway – a maior rede de restaurantes do mundo em número de lojas – tem controle suficiente para garantir o mesmo padrão de sanduíches e experiência de compra em todas as lojas sem ter que colocar seu dinheiro em cada nova unidade. O sistema de franquias respondeu bem para a rede, essa certamente foi uma importante decisão de canal de Marketing tomada no passado. Se a Subway decidisse vender seus produtos em supermercados, como fez o Bob’s, talvez tivesse problemas para garantir a qualidade dos produtos. Esse é apenas um dos riscos da expansão em novos canais controlados por terceiros.

Abaixo, apresentamos um modelo esquemático, didático, de canais de Marketing para bens de consumo, que foi desenvolvido para facilitar o aprendizado de alunos de pós-graduação em gestão de canais, e que ajuda muito a entender as responsabilidades, inputs e resultados do trabalho em planejamento de canais.

Note que as decisões de canais começam no ambiente externo, principalmente sob a ótica da concorrência. Quando a Chilli Beans começou, certamente seu maior concorrente era a Fotoptica e as óticas de bairro. A empresa modelou seu canal de Marketing (as lojas e os quiosques) para falar a linguagem do seu público-alvo e, com isso, conseguiu sucesso incomparável, até mesmo em nível internacional. Certamente a área de Marketing deles pensa tanto em suas lojas (canais) quanto em seus produtos ou em sua comunicação. Eles entenderam o peso da variável “Canais” nos seus negócios e se destacaram inovando em canais além da inovação em produtos.

* Colaboraram: Daniel D’Andrea, Luiz Sedeh e Karine Libório

Daniel D’Andrea é administrador de empresas pela FGV, com MBA pelo Insper, e executivo de Marketing e negócios com mais de 15 anos de experiência. Trabalhou na Redecard, foi superintendente de Marketing na Telefônica, diretor de marcas e produtos no Grupo Estado e diretor corporativo do Grupo Itapemirim.  É diretor do grupo ToolBox.

Luiz Sedeh é sócio e VP de Desenvolvimento da TooboxTM – Trade Marketing Know How.

Karine Liborio é bacharelando em Marketing na Universidade de São Paulo (USP).

Fonte: Mundo do Marketing