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Opinião: Menos é menos. Chega de vale-tudo

15/01/13

Se até um negócio que vive de pancada evolui e cria regras preservando os competidores, por que não o negócio de agências? *Por Alexandre Gama

Quando começou, o UFC se chamava Vale Tudo. Hoje nem no Vale Tudo vale tudo mais. Se até um negócio que vive de pancada evolui e cria regras preservando os competidores, por que não o negócio de agências?

Há óbvios conflitos de interesse entre agências na questão de concorrência, já que competem diretamente pelo cliente potencial. Mas permitir que competição seja vale-tudo só pode trazer o mercado como um todo para baixo.

A realidade é que as agências devem se preparar para um futuro com mais concorrência e “área de compra”. É preciso entender bem o ambiente atual e o modus operandi. Até porque, do lado das empresas, isso já vem sendo feito por meio de um processo estruturado pela ótica anunciante.

Não pretendo apontar solução aqui, apenas levantar a bola do que considero importante. Se contribuir para uma discussão mais ampla, já estarei ajudando minha própria agência. Afinal, é sempre melhor competir com quem nivela por cima.

1. Dividir para neutralizar: estripando a equação de valor. Valor = benefício/custo. É essa equação que rege todo produto ou serviço. O serviço das agências se apoia nessa lógica que pondera o custo cobrado e os resultados gerados. A história é pródiga em mostrar que os benefícios de uma boa ideia superam exponencialmente seu custo.

Nas concorrências, no momento da negociação entre agência e anunciante, o processo de “mesa de compra” impõe uma cisão na equação de valor. Ele divide a negociação em duas etapas, com interlocuções técnicas diferentes.

Ao marketing, a agência mostra o benefício puramente técnico de seu serviço, mas não o custo para isso. À área de compras, ela apresenta, então, seu preço, porém sem relação com o benefício que ele cobre.

Ao ser confrontada com o fato de que tem custo diferente do de outra concorrente, a agência geralmente pondera que seu serviço não é commodity e que há diferenciais importantes entre elas. Ao que o responsável por compras replica que esse é um aspecto da alçada da área de ¬marketing, que não cabe a ele discutir.

Da mesma forma, se tentar relativizar para o ¬marketing a questão da diferença de preço via qualidade, a agência ouve do responsável que preço é da alçada da área de compras — e que não cabe a ele discutir.

É dessa forma, apartando e isolando custo e benefício, que se tem neutralizado o valor, critério que as melhores agências usam para se diferenciar e precificar.

2. Toda negociação tem dois lados. Fato: há sempre o lado que vende e o lado que compra. É quando a agência e a área de compras se encontram que ocorre o principal erro de avaliação das agências: achar que é seu lado que está vendendo.

Na verdade, na fase de negociação comercial, é o anunciante que tem habilmente se colocado do lado vendedor, fazendo indiretamente de objeto da venda a possibilidade de a agência ter sua conta.

A estratégia da inversão é tornar o desejo pela conta do anunciante maior que a necessidade que ele tem do serviço da agência. Objetivo muito facilitado em concorrências onde mais de dez candidatas disputam ávida e gratuitamente uma conta.

As agências não têm percebido, ou percebido tarde demais, que negociam com uma área chamada “Compras”, mas que pensa e age com mentalidade de “Vendas”.

O grau da miopia fica agravado também pelo fato de que saber vender o próprio peixe nunca foi uma habilidade bem desenvolvida nas agências.

3. Reduzindo ao mínimo denominador comum. Quando Mies van der Rohe disse “Menos é mais” se referia a estilo e síntese. Mas no negócio da comunicação social, altamente dependente de recursos humanos, menos quase sempre desemboca em menos mesmo.

Menos remuneração = menos rentabilidade. Menos rentabilidade = menos salários. Menos salário = menos capacidade de atrair talentos. Menos talentos = menos qualidade. Menos qualidade = menos resultado.

Só nesse ponto a tendência se inverte: menos resultado = mais concorrências, já que aí a insatisfação do anunciante bate forte e de modo mais generalizado.

No entanto, todos sabemos que os únicos que podem se beneficiar de concorrências em um cenário com menor qualidade de serviço de comunicação são os intermediários de concorrências.

É claro que há sempre o que fazer para tornar a agência mais competitiva. E deve-se fazer sempre, modernizando, adaptando e aumentando a eficiência.

Mas sabemos que há limite nisso e a lógica mostra que, reduzindo a criatividade e os resultados que ela gera ao mínimo denominador comum, anunciantes e agências saem perdendo. No curto, médio e longo prazo.

Lembro que já foi redigido para a Abap há mais de um ano, o Best Practices de Concorrências. Quem não leu pode pedir à Abap e conferir com os próprios olhos.

Conferindo, vai ver que o problema das agências não é saber o que fazer. É tão somente fazer.

*Alexandre Gama é o Worldwide Chief Creative Officer da BBH e CEO da Neograma/BBH. Este texto foi publicado na edição 1535 do Meio & Mensagem, de 12 de novembro.

Fonte: M&M