Notícia

Construindo um futuro desejável

14/12/11

Com uma trajetória sólida de mais de duas décadas atuando no mercado de comunicação, a Tátil viu seu nome ser alçado aos quatro cantos do mundo após desenvolver a logomarca dos Jogos Olímpicos Rio 2016

Formado em Desenho Industrial e Comunicação Visual pela PUC Rio em 1987, Fred Gelli é sócio e diretor de criação da Tátil, empresa fundada por ele há 23 anos e ganhadora do Prêmio Caboré em 2009 na categoria Serviço Especializado. Em sua carreira, Gelli acumula mais de 90 prêmios, como iF Design Award, D&AD e Cannes Lions. Atualmente com 45 anos, é professor do Departamento de Design da PUC Rio há dez anos, onde ministra os cursos de Ecoinovação e Biomimética. Também é membro do Comitê de Tecnologias Sustentáveis da Natura.

Na esteira da vitória na concorrência que definiu quem criaria o emblema, foi escolhida também para elaborar o logo dos Jogos Paralímpicos, lançado no mês passado. Por trás desses fatos marcantes, há o Grupo Tátil, que envolve ainda a Cria, uma interessante consultoria multidisciplinar, e a Vibra, empresa de marketing esportivo mantida em sociedade com a Aktuell. As três agências propagam um mesmo posicionamento: colocar a capacidade criativa a serviço da construção de um futuro desejável. Tal conceito também diz muito sobre a filosofia de vida de Fred Gelli, sócio e diretor de criação da Tátil, envolvido em todos os negócios do Grupo. Ele defende enfaticamente que as marcas que não forem relevantes para a vida das pessoas, criando conexões emocionais, desaparecerão. Só permanecerão as marcas “vivas”, “que têm uma sintonia de corpo e alma”, acredita. Gelli ainda avisa: quer estar ainda mais próximo dos Jogos do Rio 2016 e vai entrar em todas as concorrências que puder participar, inclusive a que irá escolher a mascote da Olimpíada brasileira.

MEIO & MENSAGEM ›› O que mudou na sua vida depois da criação da logomarca da Olimpíada?

FRED GELLI ›› É o projeto mais importante que já fizemos e dificilmente faremos outro mais importante que esse. Ficou tudo mais intenso e, em certo sentido, assumi uma responsabilidade extra. Estou representando o design brasileiro em instâncias internacionais. Além disso, como a marca foi bem aceita pelas pessoas, rola uma coisa meio pop. Estive no Complexo do Alemão há dois meses e um líder comunitário veio falar comigo, disse que a marca trazia as três forças: pessoas, governos e empresas, que, juntos em um grande abraço, estão unidos para mudar o Brasil. Não tinha pensado nisso, mas OK, esse é mais um significado. Nunca tinha feito algo assim, que transcende a dimensão comercial, uma marca que representa a união dos povos em torno de uma causa comum. Há um propósito por trás deste trabalho que é muito inspirador. Talvez o maior resultado que podemos esperar desta marca no fim de 2016 é que ela seja mais do que uma marca dos Jogos Olímpicos, mas um marco desta mudança pela qual o Rio passa.

M&M ›› E para a Tátil, o que mudou em termos de negócios?

GELLI ›› Passamos a ter um cartão de visitas global. Já tínhamos feito vários projetos mundiais para Coca-Cola e Nokia, por exemplo, mas esse é diferente. É a dimensão extracomercial que essa marca tem. Claro que estamos colhendo frutos, novos clientes, mas nada de extraordinário. Sempre tivemos muito trabalho e temos um limite que não dá para ampliar da noite para o dia. Até o fim do ano, devemos registrar um crescimento de 20%. Mas o que a marca nos dá, acima de tudo, é prestígio.

M&M ›› Você pode citar alguns clientes que entraram depois da criação da marca olímpica?

GELLI ›› EBX, Renault e Batavo. Mas clientes novos sempre entraram. Tínhamos uma trajetória bastante sólida, de 23 anos com a Tátil. Entrei na PUC Rio para fazer Engenharia, mas desisti em três semanas e resolvi fazer Design. Logo descobri algo que mudou minha vida e fez a Tátil nascer, uma dimensão do design que tem a ver com ecodesign e biomimética, assuntos que mudaram minha percepção do que era design. Quando entrei na faculdade, em 1985, achava que ia desenhar uma Ferrari, cadeiras incríveis, luminárias. No meu primeiro projeto, levei embalagens de biscoitos importados para ilustrar o que gostava e a professora jogou para o lado e disse: já pensou na embalagem que te trouxe ao mundo? Ela estava falando da barriga da minha mãe como embalagem, estava me propondo estudar como a natureza embala as coisas. Cascas dos frutos, barriga da mulher, sementes. Mudei completamente a minha perspectiva. A Tátil nasceu do resultado do meu projeto de embalagens naturais, de toda inteligência que consegui acumular olhando para a natureza como uma designer e vendo as melhores soluções que já existiam até ali.

M&M ›› E como a Tátil chegou ao que é hoje?

GELLI ›› Durante mais de dez anos só fazíamos coisas eco, com baixo impacto ambiental. Tínhamos uma fábrica e produzíamos tudo, com papel reciclado. Era uma obsessão. Eu achava que o design tinha essa função. Onze anos depois, em 2001, resolvemos fazer uma mudança radical, que foi vir para este escritório em São Conrado, e viramos efetivamente uma empresa de criação. Começamos a trabalhar com experiência de marca. A dimensão lúdica já era muito importante para a gente e hoje é ferramenta estratégica da Tátil. Quando usamos ingredientes que estabelecem conexões emocionais, abrimos portas incomparáveis para contar histórias para as pessoas. A marca olímpica é um exemplo claro disso. Ela é lúdica, é uma escultura, é 3D, as pessoas querem na mão.

M&M ›› Por conta disso, você acredita que ela tem um potencial maior para o licenciamento de produtos?

GELLI ›› Quando apostamos em uma marca tridimensional fizemos uma escolha arrojada. Nunca houve nada do tipo na história dos Jogos. Para nós, fazia muito sentido: uma marca escultura para uma cidade escultura. A outra premissa era a de criar uma marca que tem de estar viva até 2016 e que tivesse a capacidade de ser explorada pelas novas tecnologias. Naturalmente, a questão dos produtos também pesou. Fizemos uma pesquisa depois que ela foi lançada e o produto que as pessoas mais desejam é a marca 3D, a esculturinha. Não é a camiseta ou o boné. E isso é muito legal, mostra o potencial da marca. Voltei de Londres agora e os produtos licenciados com a marca de 2012 são muito sem graça, são camisetas bordadas, nada muito diferente. Acreditamos que esta marca da Rio 2016 seja um patrimônio do Comitê, a qual pode gerar vendas significativas. O potencial para desenvolvimento de produtos é infinito. E não só para o licenciamento, mas para a construção de experiências com a marca. Imagine se espalharem pela cidade esculturas gigantes da marca. Na frente da Vila Olímpica, por exemplo, as pessoas poderiam atravessar a marca para entrar.

M&M ›› Por conta disso, você acredita que ela tem um potencial maior para o licenciamento de produtos?

GELLI ›› Quando apostamos em uma marca tridimensional fizemos uma escolha arrojada. Nunca houve nada do tipo na história dos Jogos. Para nós, fazia muito sentido: uma marca escultura para uma cidade escultura. A outra premissa era a de criar uma marca que tem de estar viva até 2016 e que tivesse a capacidade de ser explorada pelas novas tecnologias. Naturalmente, a questão dos produtos também pesou. Fizemos uma pesquisa depois que ela foi lançada e o produto que as pessoas mais desejam é a marca 3D, a esculturinha. Não é a camiseta ou o boné. E isso é muito legal, mostra o potencial da marca. Voltei de Londres agora e os produtos licenciados com a marca de 2012 são muito sem graça, são camisetas bordadas, nada muito diferente. Acreditamos que esta marca da Rio 2016 seja um patrimônio do Comitê, a qual pode gerar vendas significativas. O potencial para desenvolvimento de produtos é infinito. E não só para o licenciamento, mas para a construção de experiências com a marca. Imagine se espalharem pela cidade esculturas gigantes da marca. Na frente da Vila Olímpica, por exemplo, as pessoas poderiam atravessar a marca para entrar.

M&M ›› A marca paralímpica segue a mesma linha?

GELLI ›› O esporte paralímpico está crescendo muito no mundo todo, tem um potencial enorme, é um universo muito inspirador, mas não tem o mesmo alcance da marca olímpica. O briefing já pedia uma marca tridimensional, com o mesmo DNA da marca olímpica, mas obviamente guardando personalidade e identidade próprias. Partimos dessa premissa, mas tínhamos que traduzir valores muito poderosos, como o espirito em movimento, um dos valores do esporte paralímpico. A marca tinha que ser mais do que 3D, tinha que ser multissensorial, já que estamos falando com um público multissensorial.

M&M ›› Em que consiste exatamente o trabalho de vocês para o COI e o IPC? Haverá outras concorrências?

GELLI ›› Elaboramos as marcas e os manuais. Certamente serão feitas outras concorrências para várias coisas como a mascote, por exemplo. Entraremos em todas, queremos ser parceiros deles até o final. Já temos ideias para tudo.

“Durante muito tempo, um recurso que as marcas usaram foi o de vestir uma roupa com a intenção de disfarçar uma alma que, na verdade, não combinava com aquele corpo”

M&M ›› Como você avalia o momento atual­ do design brasileiro?

GELLI ›› Teve uma bela sacudida no branding e no design no mundo. A realidade está mudando e as empresas entenderam que os diferenciais competitivos começaram a escassear e que, para que as marcas continuassem a ser relevantes para as pessoas, precisariam criar experiências mais memoráveis, investir nos pontos de venda, já que a decisão das pessoas se dá cada vez mais neles. Houve uma valorização das ferramentas de design e branding. No Brasil, estamos embalados nesta onda. Mesmo assim, por mais que sejamos mais relevantes do que éramos no passado, a distância ainda é enorme para a publicidade em termos de faturamento.

M&M ›› Espera que esta situação se reverta?

GELLI ›› Em algum momento, sim. Temos estruturas tão competentes quanto à publicidade, tão caras quanto, profissionais tão bem formados quanto, e entregas muito consistentes. Fazemos diferença para as marcas. Isso tem de ficar um pouco mais equilibrado. O design brasileiro tem características muito interessantes, particulares. Sabe transformar o ordinário em extraordinário, fazer muito com pouco. Não adianta ser criativo gastando milhões ou detonando o meio ambiente. Tem de ser inteligente para gerar alto impacto sensorial com baixo impacto ambiental.

M&M ›› Como o design brasileiro é visto lá fora?

GELLI ›› As pessoas veem um brilho, uma coisa lúdica, envolvente, um design emocional. E o momento é interessante para o design brasileiro porque o mundo está precisando de um design emocional, de uma dimensão lúdica, dessa capacidade de fazer muito com pouco. Estamos construindo uma imagem bastante original.

M&M ›› Quais as áreas em que a Tátil atua hoje?

GELLI ›› A Tátil é uma consultoria de design e branding que acredita na construção de relações sustentáveis entre pessoas e marcas. Queremos ajudar nossos clientes a garantir que suas marcas sejam vivas. E as marcas só são vivas se têm uma sintonia de corpo e alma. A alma é a essência, conceitos, razão de ser das marcas, os propósitos, o que faz elas serem o que são, conceitualmente. E o corpo são todas as expressões: cores, embalagens, a marca em si, a comunicação. Quando você cruza essas duas coisas e consegue fazer com que uma marca tenha sintonia entre corpo e alma, todas as experiências que ela promoverá para as pessoas serão consistentes, porque vão ser reflexo dessa sintonia. Parece uma coisa óbvia, mas não é. Está cheio de marcas querendo ter um corpinho que não bate com a sua imagem.

M&M ›› Você acha que a maioria das marcas é o que fala? Elas refletem o que querem dizer?

GELLI ›› Elas terão de ser cada vez mais o que dizem que são; o telhado é cada vez mais frágil. E não é muito delicado você falar que está fazendo uma coisa que não está. Mas durante muito tempo esse foi um recurso que as marcas usaram: vestir uma roupa que tinha a intenção de disfarçar uma alma que, na verdade, não combinava com aquele corpo. Hoje as marcas estão brigando pela atenção. Para isso precisam acumular informações e experiências em cada um dos pontos de contato. Essa consistência tem a ver com a construção de relações sustentáveis para marcas. E a sustentabilidade é, hoje, uma questão de sobrevivência. Acredito que o design pode realmente fazer diferença para o mundo e queremos colocar a nossa capacidade criativa a serviço de um futuro desejável.

M&M ›› E como fazer isso?

GELLI ›› Contribuindo para redesenhar essa lógica de relacionamento das marcas com as pessoas. As marcas hoje são as instituições mais poderosas do planeta, mais do que governos, igrejas e religiões. Elas dão as cartas no mundo e, por isso, têm muitas responsabilidades neste futuro desejável, não por filantropia ou elevação espiritual, mas para que elas mesmas possam existir no futuro. Não acredito que uma empresa possa ser sustentável tentando fazer o que todo mundo faz: parando de usar papel virgem, mandando dinheiro para as crianças na África, protegendo as baleias e fazendo muita publicidade. A única forma para construir uma ponte entre o que a marca é hoje e o que será no futuro é ter alicerces ligados à essência da marca. É preciso garimpar na essência da marca um propósito que amplia as perspectivas da companhia na direção desse futuro, para garantir relevância às pessoas.­ A partir daí, pode-se construir novos negócios. Mas a Tátil não tem expertise para isso, e aí que entra a Cria.

M&M ›› O que é a Cria?

GELLI ›› Um grupo multidisciplinar para dar conta desse desafio. A Cria usa o propósito que a Tátil identifica na essência das marcas e modela novos produtos e serviços para as empresas que querem estar no futuro e enxergam tal perspectiva completa e real.

M&M ›› A Cria já tem clientes?

GELLI ›› Coca-Cola, Fanta, Whirlpool. Para a TIM, garimpamos um propósito para que ela fosse mais relevante especificamente para a classe C. Identificamos um caminho que chamamos de mobilidade plena, com a TIM como parceira que se interessa pela mobilidade social daquela pessoa. Essa primeira etapa foi feita pela Tátil, e aí entrou a Cria para utilizar o conceito de mobilidade plena e modelar novos negócios. Focamos, por exemplo, nos motoboys. Eles gastam um tempo danado para ir até lan houses e checar multas de trânsito. A TIM vai ter um aplicativo pelo qual será possível acessar o banco de multas do Detran, via telefone.

M&M ›› Como estão os primeiros passos da Vibra?

GELLI ›› Montamos em parceria com o Rodrigo Rivelino, da Aktuell, e o André Beck. É uma empresa de branding esportivo e tem a mesma visão das outras duas­ empresas do Grupo Tátil. O esporte é um caminho para transformar o mundo, e que tem uma capacidade de mobilização gigantesca. Mas é um mercado pouco maduro. A relação entre marcas e esportes é pouco sustentável, superficial, e queremos mudar isso.

Fonte: M&M