Toda agência tem o discurso de criação integrada na ponta da língua, mas a prática é bem diferente
Uma das maravilhas (e pesadelos) de trabalhar diariamente com gente do off, do digital, do design e das redes sociais é ver o quanto eles são diferentes entre si. Apesar de serem todos criativos, acredite, há diferenças enormes entre cada especialidade. Desde o timing, o processo de trabalho, o background, o vocabulário e assim por diante.
O off produz em massa. É comum eles fazerem rapidamente dezenas e até centenas de opções para cada peça, filme, anúncio. O lema aqui é “a qualidade vem da quantidade.”
O digital é bem mais complexo. Para criar, leva-se em conta uma infinidade de fatores, como peso da peça, local onde ficará hospedada, ambientes receptivos, arquitetura de informação, desenvolvimento de conteúdo, tecnologia etc. Para complicar, muitas vezes quem cria também é quem produz.
O designer poderia trabalhar em delegacia de tão investigador que é. Antes de criar qualquer coisa, faz uma profundaimersão no assunto, no planejamento, no histórico da marca, no trabalho dos concorrentes e no ponto de venda. Não raro, a solução é uma só; mas a indicada para o problema.
Redes sociais é a área mais nova — e por isso ainda não totalmente compreendida. Para ficarmos apenas numa parte desta disciplina, numa campanha normalmente complementam o trabalho das outras áreas e só funcionam de verdade quando a ideia funciona. Resumindo: redes sociais são como “ecos” de uma campanha. E ,para ter eco, é preciso ter algum barulho, certo?
Alguns podem dizer “Mas você está generalizando.” Pois bem, amigos, olhem a verdade fundamental: não dá para fazer afirmação nenhuma sem generalizar um pouquinho. É impossível dizer que “cigarro mata”, “comer engorda” ou “queniano é bom em corrida” sem generalizar. Então, estou mesmo.
Mas voltando ao assunto: tantas diferenças vêm provocando bastante desencontro, discussão e atravancando o processo de integração nas agências. Adicione o ego e a insegurança de cada um e você terá noção do caldeirão de problemas que podemos ter hoje nas criações.
Alheio a isso tudo, atualmente toda agência tem o discurso de criação integrada na ponta da língua, afirma não existir mais equipe on e off e blá-blá-blá. Mas na prática é bem diferente. Continuam no velho esquema um-cria-e-o-outro-adapta, sem uma real mistura.
Como estou nesta levada há muito tempo (desde 2000 convivo diariamente com equipe de on, off e design) aprendi coisas interessantes que divido agora com vocês:
1 – Impor o mesmo processo criativo para todos geralmente não dá certo. Como disse, cada área tem o seu próprio modelo de trabalho. Para tirar o melhor de cada profissional, respeite as diferenças e organize as coisas de forma que cada um renda do seu jeito.
2 – Foque no que os unifica: a busca pela boa ideia. Mas não subestime a expertise de cada um. Quer dizer: na hora de criar, todos podem ficar juntos. Mas na hora de executar, cada especialista no seu quadrado.
3 – Não importa se sua agência é nativa off ou digital, pensar que uma área é superior à outra é garantia de não integração. Austin Howe, ex- diretor de criação da Wieden + Kennedy e Crispin Porter, comete exatamente esse equívoco. No livro Designers Don’t Read, ele defende descaradamente a superioridade dos designers sobre os diretores de arte. Como ter profissionais se respeitando e trabalhando juntos num ambiente desses?
4 – Quem acha que um dia haverá criativo capaz de criar e executar para todas as mídias é, no mínimo, mal informado sobre a complexidade e o potencial de cada mídia. Cada meio exige background, aprofundamento específico e atualização constante. O que é humanamente impossível diante da multiplicidade cada vez maior de meios (Cannes que o diga, com suas 500 categorias).
Mal comparando, seria como dizer que agora todos os médicos serão “integrados.” Já pensou? Não teremos mais especialistas, só clínicos gerais. Compreendem o disparate?
Enfim, penso que teremos sempre especialistas, mas também profissionais realmente abertos a trabalhar em grupo, sem tanta preocupação com autoria das peças e outras barreiras.
Já existe uma nova geração de profissionais híbridos, que transitam por aqui e ali sem preconceitos e realmente interessados em gerar uma ideia sem formato. Mas ainda são minoria e, em breve, gente assim vai valer ouro (não falo só de prêmios).
Ao contrário do que muita gente pensa, integrar a criação não significa necessariamente colocar todo mundo para trabalhar junto. Ouvir a opinião dos outros na hora de criar também é uma forma de integrar. Além de ampliar a visão da situação e estimular a quebra de formatos, conviver com o diferente amplia nossa capacidade criativa. Como disse Albert Einstein: “Uma mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original”.
Este artigo, de Carlos Domingos, sócio e diretor de criação da Age Isobar, foi publicado na edição 1477 de Meio & Mensagem, com data de 19 de setembro de 2011.
Fonte: M&M
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